Preciso confessar-me. Não aquelas confissões feitas na escuridão dos púlpitos, em inflexões envergonhadas, apenas para merecer a comunhão nas missas de domingo. É uma confissão pública. Estou absolutamente apaixonada pelo cerrado, suas jataís douradas que acarinham teus braços, as surpresas cotidianas e absolutamente efêmeras. Flores que se abrem e somem, de coloridos estranhamente belos. A neblina ao pé dos pequenos montes, que parece o mar espumante. A estrela d'Alva que assombra o despertar curto na madrugada, onde os olhos se abrem, espiam o céu escancarado pela vidraçaria da cabana e retornam ao sono, aconchegados pelo cobertor morno que abraça e amolece o corpo.
A cada vez que me arrisco nas trilhas apenas anunciadas, lá vem a beleza. Uma beleza que persiste no pé de urucum atropelado pelo motorista bêbado da madeireira e, apoiado pela varetinha, lança os frutos vermelhos, a provocar o lilás das flores vaidosas. Espero os frutos. Sei que virão.
Quero entranhar-me, confundir-me com essas folhagens ásperas, com essa teimosia em renascer das pedras, queimadas, sentir-me parte desse lugar que escolhi. Minha morada.
Não quero aqui fazer um quadro contemplativo, morto. Quero viver as horas do lugar. Descobrir que o vento também vem do norte. E muito. E não é quente. Que a chuva ultrapassa o oeste, se deita, inclina. Rodopia. Invade tudo. Na Armação, aprendo. Para ver-me assim, como eu sou. E como quero ser. Melhor. Condescendente. Difícil. Mas aprendo.
Deixo com vocês a laranjinha do cerrado em flor, o urucum teimoso, o campin florido e a vista noturna da cabana. Que Gonçalo, lá do Cristo Redentor, sentencia - filha, casa de madeira é barraco. E que barraco, amigo... cheio de estrelas!
Um comentário:
Que lindo isso que escreveu, Tânia.
Que saudade de você, ternura e vivacidade. Já aprendeu tudo amiga.
Um beijo.
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